quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Tentação

Abriu o maço de cigarros para descobrir que estava vazio.

- Ah, não!

Vestiu um Adidas preto, velho e surrado, sem meias. Colocou o primeiro agasalho que encontrou.

Saiu do apartamento sem trancar a porta. Entrou no elevador torcendo para que não parasse em nenhum andar, seriam treze longos andares até lá em baixo e detestava o quanto sentia desconforto em ficar em espaços pequenos com desconhecidos. Mesmo que os visse regularmente.

Não cumprimentou o porteiro e apenas saiu em disparada até a banca de jornais que ficava há mais ou menos cem metros da entrada de seu prédio.

"Adoro bancas que vendem de tudo menos jornais" Pensou e riu para si mesmo.

Enquanto andava o celular tocou, pensou em não olhar quem era para não ter que atender e foi o que fez. "Se eu não souber quem é, não tem problema não ter atendido" e riu novamente.

Um maço de Malboro Light, por favor. Pagou sem olhar diretamente para o atendente da banca, só queria voltar o mais rápido possível.

Fez exatamente o caminho inverso, com o mesmo ar de pressa e o olhar o mais baixo possível, para não ter que cruza-lo com ninguém. Detestaria ter que dize rum simples oi.

Abriu a porta do apartamento, enquanto tirava o tênis pisando no próprio calcanhar, o primeiro ficou jogado bem perto da entrada o segundo ele chutou pela sala. O moleton teve destino parecido.

Abriu a varanda e acendeu o cigarro. Se preocupou em fechar o vidro para que o cheio não entrasse no apartamento. Não poderia suportar seu apartamento fedendo à cigarro. Esse cheiro era de apartamento de fumantes. E ele não era um fumante, apenas fumava quando sentia vontade. Mesmo que há anos. Não fumava todos os dias, então dizia pra si mesmo que não era um fumante e para os outros também.

Assim como o cigarro durou pouco, seu devaneio também. Voltou para dentro da sala e embora quisesse acender mais um, não podia. Fumar dois cigarros assim, seguidos, era coisa de fumante.

Pensou em ligar para a namorada, ou para a menina que saia quando estava de saco cheio da namorada. Pensou também em ligar para uma nova menina que ele falava há tempos e sabia que faria o que ele quisesse. Mas a preguiça era muito maior que o tesão. Embora não sentisse mais o mesmo tesão por sua namorada, achava que ainda gostava dela. E mesmo quando estava traindo ela, não achava que estava traindo de verdade, estava apenas aliviando o stress ou matando alguma vontade. Não envolvia nenhum sentimento, dizia para seus amigos.

Enquanto segurava o celular pensnado em quem podia ligar, lendo os nomes e pensando nas pessoas via o quanto estava sozinho, mesmo conhecendo tantas pessoas o quanto não tinha ninguém para fazer companhia para ele. Tudo era muito complicado ao seu ver, ninguém parecia valer o esforço de se arrumar e dirigir ou de arrumar o apartamento para que a pessoa viesse.

Não tinha um amigo para dividir aquela imundisse de apartamento.

Ele parou na letra M e leu o nome da namorada: Marina. Seu dedo indicador tocando na tela, com uma vontade de ligar para ela, mas desistiu. Não tinha energia para mentir pra ela hoje, para fingir.

Na verdade tinha vergonha dela, queria contar a verdade, mas não conseguiria ser encarado como um traidor. "Nunca pensei que eu fosse acabar fazendo essas coisas".

Decidiu que ia passar o resto do dia sozinho, vestido da mesma forma que havia acordado e não iria ver jamais quem havia ligado para ele enquanto estava na rua. Não queria jamais saber quem era. Melhor ainda, o celular permaneceria desligado pelo resto do dia. Só para garantir que ninguém mais ligaria para tenta-lo de nada.

Tentação.

Como era fácil cair em tentação. "Deve ser por isos que eu nunca rezo". Pensou, sem rir dessa vez."Ele vai saber que provavelmente estarei mentido e arrependido ao mesmo tempo" .

Mesmo imaginando se uma coisa eliminaria a outra, ainda sentia-se péssimo com suas escolhas.

Levantou batendo as mãos no sofá.

- Foda-se! Vou fumar outro cigarro e aqui dentro! - Falou para as paredes. Estava na hora e admitir alguma coisa.

Um comentário:

Mariana Burgos disse...

Oi. Apareci aqui por indicação de uma amiga em comum, a Lara.
Achei legal seu blog. Correndo o risco de ser invasiva, vou fazer uma sugestão: você já leu Sartre? Acho que você iria se identificar. Se quiser, ou tiver tempo, procure "A Náusea" dele. Vale a pena!